* Este texto reproduz na íntegra o artigo publicado no portal do jornal O Globo em 24/05/2022
A falta de tradição do Rio de se unir em torno dos seus próprios interesses é bem conhecida desde os tempos da mudança da capital, nos anos 1960. Como se não acreditassem no que estava por vir, as lideranças políticas fluminenses de então, empresários e formadores de opinião em geral, assistiram impávidos à transferência para Brasília sem lutar por uma compensação, como
fez Bonn, quando Berlim voltou a ser capital da Alemanha, em 1990.
Nos anos 1980, sob patrocínio da bancada de São Paulo, o maior consumidor de energia do país, a Constituição de 1988 foi promulgada com um artigo, o 155, que subverteu a regra tributária brasileira: diferentemente de todos os demais bens e produtos, o ICMS sobre petróleo e derivados, e também a energia elétrica, seriam tributados no estado de destino, e não no de origem. Como “compensação”, foram criados os royalties, uma receita volátil, dependente da produção, do câmbio e dos humores do mercado internacional. O Rio, como se sabe, responde por mais de
85% de toda a produção nacional de petróleo. É o segundo maior PIB do Brasil, mas está em 13º lugar em arrecadação de ICMS per capita entre as 27 unidades da Federação.
Com a descoberta do pré-sal, assistimos a um novo ataque à economia fluminense. Em 2012, o Congresso aprova a lei federal 16734/12, que distribui entre todos os municípios — e não apenas
os produtores de petróleo — todas as receitas oriundas dos royalties. Em inédita mobilização, o Rio consegue levar uma multidão às ruas em protesto. Deu (parcialmente) certo. O STF concedeu liminar suspendendo os efeitos da lei, mas até hoje não julgou o mérito da ação. A espada continua apontada para o nosso
pescoço.
Agora, estamos outra vez sob ataque. Numa manobra que visa claramente a atender mais a interesses privados do que aos do povo brasileiro, os atuais líderes do Congresso tentam, por meio
de uma emenda estapafúrdia dentro da lei que autoriza a privatização da Eletrobras, embutir um jabuti segundo o qual o Brasil deve priorizar a construção de termelétricas nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste — onde não há gás nem alto consumo de energia, mas sobra energia solar e eólica —, em detrimento do Sudeste, que produz gás e consome muita energia.
A medida equivaleria a obrigar o Rio, que tem gás de sobra, a importar energia gerada pelos ventos do Ceará. Não faz qualquer sentido. O custo do transporte para tão longe vai impactar no
preço, a ser pago, como de costume, por todos os brasileiros.
A lei prevê que os leilões para as regiões Norte, Nordeste e Sudeste devem acontecer até 2026. Já para o Sudeste, o investimento ocorreria a partir de 2030 — e com 75% da produção
vinculada exclusivamente às áreas sob influência da Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (Sudene).
Não é possível calarmos diante desse absurdo. Por isso, além da
Ação Direta de Inconstitucionalidade impetrada pela Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) no STF, com o objetivo de impedir esse jabuti, faremos hoje, por meio do Fórum
Permanente de Desenvolvimento Jornalista Roberto Marinho, uma grande reunião com entidades como a Firjan, Fecomércio, Associação Comercial, universidades, sindicatos, Rio Industria,
entre outros atores, para debater essa questão. Parlamentares da bancada federal também foram convidados. Precisamos nos unir e impedir mais esse ataque à nossa economia, em defesa dos
legítimos interesses do Estado do Rio de Janeiro.