Supremo precisa preservar solvência e futuro do Rio
Se a Corte redistribuir os royalties do petróleo pela Federação, contas do estado entrarão em colapso
Opinião O Globo – publicado em 25/10/20
Foi longo o esvaziamento da cidade do Rio com a mudança da capital federal para Brasília. Agora, a solvência do estado está ameaçada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), em julgamento marcado para 3 de novembro. Se a Corte mantiver a lei aprovada pelo Congresso no final de 2012, que retira parte dos royalties dos estados produtores de petróleo para redistribuí-la pelo resto da Federação, as finanças do Rio entrarão em colapso.
Fragilizado, dependente de um programa de recuperação fiscal que mal consegue cumprir, maior produtor de óleo e gás do país, o Rio há tempos virou um problema nacional, por tudo o que representa para o Brasil. Os efeitos da lei de 2012 foram suspensos no ano seguinte, por uma liminar concedida pela ministra Cármen Lúcia a pedido do estado. A decisão do STF sobre essa liminar, marcada para dia 3, afetará também Espírito Santo e São Paulo.
As cifras em jogo são preocupantes. Pelos cálculos do economista Mauro Osório, estudioso da economia fluminense, se o STF referendar a lei, o estado perderá R$ 57 bilhões até 2025. Ficará inviável. Máquina e serviços públicos entrarão em colapso definitivo. Basta considerar que o Orçamento deste ano, mesmo mantida a previsão da receita integral dos royalties, já acusa um déficit de R$ 20 bilhões.
A observação do que aconteceu com o Rio desde a década de 70 revela um caminho sem volta aparente. O estado perde relevância por ter uma economia que cresce pouco, portanto uma base estreita de arrecadação de impostos. Não é muito industrializado, nem tem agropecuária de peso. A produção de sua principal riqueza, petróleo e gás, não é taxada por ICMS no estado, pois os combustíveis recolhem o imposto no estado onde são consumidos. Em virtude disso tudo, o Rio é apenas o 17º estado do país em receita corrente líquida per capita. Só tem a 13ª arrecadação de ICMS, o mais importante imposto para os governadores.
Mesmo assim, de acordo com dados da assessoria fiscal da Alerj, chefiada por Mauro Osório, contribuiu em 2019 com 16,7% das receitas federais. Em troca, a União transferiu ao Rio apenas 9,6% do total dos recursos que redistribuiu pela Federação. Não é muito mais que os 8,2% que destinou à Bahia, responsável por apenas 1,8% da arrecadação federal. Trata-se, no mínimo, de uma injustiça federativa.
O longo ciclo de esvaziamento carioca e fluminense deixa marcas. Uma delas a taxa de desemprego no estado, hoje equivalente à do Nordeste. No segundo trimestre, de acordo com o IBGE, ela foi de 16,4% no Rio ante 16,1% no Nordeste. De janeiro de 2017 a agosto último, enquanto o emprego com carteira assinada no país cresceu 1,3%, no Rio caiu 9,5%. O estado perdeu 324.770 empregos formais.
É esse o contexto de um julgamento em que devem ser levados em conta todos os aspectos, não só os jurídicos. Os motivos expostos são suficientes para justificar a retirada da liminar da pauta. Seria o ideal também para que voltasse a ser debatida a proposta de acordo feita pelo Espírito Santo, com potencial para atender a todos os estados.